ESPAÇO MEMÓRIA | Rota do Trabalho e da Indústria

Industrialização e associativismo

Antecedendo em poucos anos o aparecimento da indústria no concelho, o fenómeno do associativismo, a exemplo do que sucedia noutras localidades do país, tem as suas origens ligadas a um grupo de comerciantes e proprietários locais que, em 1848, resolve fundar a Sociedade Filarmónica Barreirense para recreação da elite burguesa. Contudo, será no decurso do processo de industrialização, gerador de dinâmicas sociais poderosas, que o associativismo se vai desenvolver enquanto fenómeno social de cariz popular afirmando-se, e criando raízes, na vida e na cultura local. 

No quadro das grandes transformações que, a partir de meados de Oitocentos vão caracterizar o Barreiro, ocorre em 1870 uma cisão interna nesta Sociedade Filarmónica. 
Esta divisão não corresponderá tanto a desavenças internas mas, antes, poderá significar um reflexo das alterações ao nível social, decorrentes da industrialização.
Em 1870 o Barreiro era já uma a vila operária, com uma população significativa de ferroviários e corticeiros. São provavelmente os reflexos das tensões sociais existentes, ou o emergir de uma consciência operária, que acabará por dar origem à divisão e à formação de duas novas associações, a Sociedade de Instrução e Recreio Barreirense «Os Penicheiros» e a Sociedade União Democrática Barreirense «Os Franceses». 

A elevada densidade de população operária oriunda de outras regiões e a necessidade de integração destes trabalhadores e suas famílias na vida local, deu corpo a um leque de associações mutualistas e de socorros, colectividades, cooperativas, sociedades recreativas, grupos desportivos, bandas filarmónicas, orquestras, grupos teatrais e outras, mais de carácter reivindicativo como as associações de classe e os sindicatos, que imprimiram à vida no Barreiro uma riqueza social e cultural ímpar.

Actualmente, além de os «Penicheiros» e «Franceses» existem ainda as associações centenárias SFAL - Sociedade Filarmónica Agrícola Lavradiense (1867), a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários dos caminhos de Ferro do Sul e Sueste (1894), a SFUA - Sociedade Filarmónica União Agrícola 1º Dezembro (1898), o Futebol Clube Barreirense (1911) e as Cooperativas “Corticeiros” (1911) e Popular Barreirense (1913).

Numa vila industrial, como foi o Barreiro durante mais de um século, o movimento associativo popular teve um papel social insubstituível junto da população. Em especial, as numerosas bibliotecas associativas que se constituíram como importantes polos de dinamização social e cultural, ao nível da instrução dos seus associados, ensinando-os a ler e a escrever, ministrando cursos de matemática, desenho industrial, história, línguas estrangeiras e literatura, entre outras. 

Espaços de intensa sociabilidade e convívio, as colectividades promoviam com regularidade os famosos “Bailes da Pinha”, as “Soirèes” e “Matinés Dançantes” e sessões de cinema. Acolhiam grupos de teatro, bandas filarmónicas, orquestras de jazz e os mais variados grupos musicais, proporcionando gratos momentos de recreio e lazer aos seus associados. 

O movimento associativo no Barreiro deu ainda expressão a manifestações de resistência social e política, desenvolvendo actividades de oposição à ditadura e despertando consciências para a falta de liberdade em que o país vivia mergulhado, especialmente na década de 60 após o eclodir da Guerra Colonial. 

Para a história do movimento associativo no Barreiro, ficam as actuações de Zeca Afonso no Ginásio do Luso, a 11 de Novembro de 1967, em que a assistência em coro entoou a canção proibida “Os Vampiros” o que culminou com a prisão pela PIDE/DGS de vários membros da Direcção do Cine Clube do Barreiro, ou ainda a atuação memorável de Carlos Paredes na Sala dos Corticeiros, em 1969, na campanha da Oposição Democrática para as eleições à Assembleia Nacional.

O movimento associativo popular beneficiou extraordinariamente com a liberdade de associação, conquistada com a Revolução de 25 de Abril de 1974, existindo actualmente mais de duas centenas de associações de variados tipos. 

Projetando uma imagem dinâmica e positiva do concelho, as colectividades foram verdadeiras dinamizadoras da vida social no Barreiro e são depositárias de um património intangível, constituído por muitas vontades, horas e horas de dedicação e esforço voluntário, além de um significativo património edificado, constituído pelas suas sedes sociais. 

Enraizado e bem vivo na cultura local, o Movimento Associativo Popular é merecedor da dimensão social que hoje se lhe conhece.
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